Recife, capital pernambucana, foi a primeira cidade brasileira parceira na Rede Urban95 Brasil, sendo o investimento na primeira infância uma estratégia inovadora do município para combater a criminalidade e a desigualdade nos bairros mais vulneráveis. Uma equipe administrativa e um comitê diretor intersetorial foram criados para orientar o trabalho e desenvolver uma lei municipal pela primeira infância.
A cidade, então, firmou uma parceria público-privada com a ARIES – Agência Recife para Inovação e Estratégia – para testar estratégias de mobilidade e espaços públicos inspirados na Rede Urban95 e várias iniciativas começaram a florescer. Uma deles é ampliação do Programa Mais Vida nos Morros para 40 comunidades, trazendo melhoria do espaço público, redução de lixo, e proteção contra desabamentos nos morros.
Reinventar o lugar em que se vive
O Mais Vida nos Morros é uma política pública de inovação que reinventa a cidade e combate a desigualdade socioespacial a partir da promoção do desenvolvimento sustentável, do protagonismo comunitário e da promoção de um espaço urbano melhor para as crianças nas 545 comunidades de interesse social do Recife.
Cada comunidade escolhe suas prioridades e coloca a mão na massa para pôr os projetos em prática. Mas, para que isso se concretize, é preciso a participação de todos. Cada um contribui como quiser. Pode ser com o trabalho ou compartilhando seus conhecimentos, seus sonhos e suas ideias. O projeto realiza várias atividades, como oficinas de criatividade para crianças e adultos.
O Mais Vida nos Morros é inspirado em experiências da Colômbia, México e Venezuela que apontam para uma mudança no comportamento das pessoas quando o poder público realiza intervenções urbanas e estéticas em áreas desfavorecidas.
Para a arquiteta e urbanista espanhola Irene Quintáns, especialista em estudos territoriais, políticas sociais, mobilidade, habitação e gestão urbana, esse tipo de engajamento é um diferencial do Mais Vida nos Morros em relação a programas do chamado urbanismo tático no resto do mundo. Outro diferencial importante, segundo ela, é o contexto urbano vulnerável em que o programa atua e faz a diferença. “O Mais Vida nos Morros entra para resolver vários fatores de risco. Alguns são físicos, outros emocionais”, diz a especialista. “Não é um programa que põe tinta e pronto. É um programa que trabalha a autoestima das pessoas, o pertencer a um lugar, o cuidado próprio e comunitário”, reforça.
Essas experiências podem ser compartilhadas – no Recife e além – para que sirvam de inspiração e estimulem cada comunidade a repensar e reescrever seus caminhos. Alto José Bonifácio Alto José do Pinho e Alto do Maracanã são alguns dos bairros já finalizados.
O colorido dos morros chama a atenção, mas a inovação está presente nos detalhes que as fotos panorâmicas não mostram. No Vasco da Gama, as calçadas viraram um caminho lúdico, cheio de brincadeiras para as crianças. Já no Campo da União, um bequinho se transformou num campinho de futebol. Em Alto José Bonifácio, as vielas da comunidade se tornaram uma pista de corrida com escadarias e rampas. Na Lagoa Encantada, a praça virou um lugar de jogos, brincadeiras, encontros e ganhou uma horta comunitária.
Essas e outras soluções são pensadas para cada comunidade, mas nascem a partir de 10 objetivos comuns relacionados a engajamento comunitário e intervenções no território:
- Transformar micro vazios urbanos (espaços degradados, vulneráveis ou com acúmulo de lixo) em áreas de lazer, convivência ou espaços para as crianças;
- Implantar políticas para diminuição da quantidade de lixo que vai para os aterros municipais;
- Redesenhar e repensar toda a infraestrutura urbana da comunidade (escadarias, calçadas, becos e vielas) sob a perspectiva das crianças, especialmente na primeira infância;
- Integrar políticas públicas já existentes para a área beneficiada;
- Integrar os diferentes órgãos e secretarias do município, além de parceiros da iniciativa privada, em prol dos territórios beneficiados pelo programa;
- Empoderar todos os moradores (adultos, idosos e crianças) a partir da escuta ativa e da participação nas tomadas de decisão;
- Engajar os moradores na transformação da sua comunidade, exercendo cidadania ativa;
- Promover sustentabilidade e resiliência da comunidade a partir do protagonismo do morador;
- Promover uma mudança de comportamento dos moradores em prol da transformação e da sua preservação posterior;
- Reinventar a relação do morador com a sua comunidade despertando um sentimento de orgulho, autoestima e pertencimento.