A cidade de Boa Vista, capital de Roraima, tem predicados de sobra para justificar o slogan que vem divulgando há quase uma década: o de capital da primeira infância no Brasil. E essa trajetória vem sendo liderada por um dos programas mais conhecidos no país, o Família que Acolhe.
Entre os principais impactos dessa política pública estão a integração de todos os serviços básicos necessários para mães e filhos na primeira infância, garantindo que as consultas, exames e procedimentos médicos sejam marcados e acompanhados. O programa também desburocratizou o acesso à educação e ao desenvolvimento social.
Antes mesmo de nascer, a criança já tem sua matrícula feita na creche e na pré-escola até os seis anos de idade, quando começa o ensino fundamental. Mães e familiares também têm acesso garantido a uma “educação familiar”, uma verdadeira “escola para pais”, para fortalecer os laços de afeto com a criança e a estabilidade familiar em situações muitas vezes complexas.
Com base no conceito de uma “escola de pais”, foi criada na sede do programa a Universidade do Bebê, onde gestantes, novas mães e familiares recebem informações sobre o desenvolvimento psicossocial das crianças. As famílias participam ainda de oficinas de música, coral e leitura, para criar uma cultura de promoção do hábito da leitura desde o berço. Também são entregues leite e enxovais para as crianças e vale-transporte para os pais.
Em 2014, o programa iniciou o Projeto de Formação em Desenvolvimento da Primeira Infância, para capacitar profissionais das áreas de saúde, educação, assistência social e comunicação. Grávidas, mães e bebês são acompanhados por uma equipe multidisciplinar de 180 pessoas. Além disso, proporciona consultas de planejamento familiar, para que mães adolescentes não repitam uma gravidez imprevista.
O Família que Acolhe é um programa multissetorial, gerido com recursos da prefeitura, e com a participação integrada das secretarias municipais de Gestão Social, Saúde, Educação, Comunicação e Finanças. Também envolve os Centros de Referência de Assistência Social (Cras), onde acontecem algumas atividades nos bairros
As atividades também acontecem nas Casas Mãe (modelo de creche da Prefeitura de Boa Vista) e na Unidade Básica de Saúde 24 horas Olenka Macellaro. A descentralização permite que mais famílias participem.
São atendidas crianças de 0 a 6 anos, gestantes cadastradas no Bolsa Família, inscritos em creches municipais, adolescentes gestantes e famílias e as educandas do sistema penitenciário.
“Se não houver envolvimento do gestor com a primeira infância, não há como avançar”, diz Teresa Surita, ex-prefeita de Boa Vista e criadora do programa. Segundo ela, aplicar no dia a dia do serviço público o conceito de desenvolvimento infantil, unindo saberes de diversas ciências, é um grande desafio que exige muito trabalho e sensibilidade dos profissionais envolvidos.
“Ao assumir a prefeitura em 2013, não tive dúvidas de que transformar Boa Vista na Capital da Primeira Infância no Brasil seria o maior legado que poderia deixar para a nossa cidade. Naquela época, pouco se falava sobre primeira infância ou sobre as sinapses e conexões que acontecem no cérebro de uma criança, desde sua concepção. Ao contrário do que se pensa, investir na primeira infância não demanda tanto tempo. As crianças respondem muito rápido aos estímulos e para as famílias esse retorno é positivo e palpável, a curto prazo”, disse Teresa Surita. “Os três primeiros anos são para sempre.”
“As parcerias de estudiosos e organizações especializadas na primeira infância, principalmente na capacitação de nossos servidores nesse trabalho, como a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Instituto Primeiros Anos e Instituto Alfa e Beto, têm sido muito importantes. Hoje estamos ampliando essa rede, em nível internacional, com envolvimento de entidades como a Fundação Holandesa Bernard Van Leer, a University of New York e a New York Academy of Sciences”, comemora a ex-prefeita.