Bebetecas como espaços de desenvolvimento integral para bebês e seus cuidadores

Bebetecas são espaços de leitura especializados na primeira infância – com ênfase a crianças de 0 a 3 anos – que garantem um lugar para brincar livre e para o contato com os livros. Esses espaços auxiliam no desenvolvimento integral e saudável da criança, estimulando a criação e a criatividade, fortalecendo vínculos entre cuidadores e bebês e ofertando um território de descanso, observação e cuidado para estes adultos.

“A bebeteca é um espaço ao mesmo tempo seguro e desafiador”, elucida Ana Maria Bastos, fundadora da Descobrir Brincando, iniciativa parceira da Urban95 que sensibiliza e instrumentaliza profissionais que utilizam bebetecas em seu cotidiano. “É um espaço onde a criança pode e deve exercer a liberdade do movimento. Tudo está acessível e pensado para o desenvolvimento motor, intelectual, emocional da criança”.

Geralmente localizadas em equipamentos e espaços físicos que já tenham alguma interação com o público da primeira infância – como escolas e creches, mas também serviços de assistência social e centros culturais – bebetecas podem assumir formatos diversos a depender do território ou equipamento onde se encontram. Confira algumas especificidades que caracterizam as bebetecas:

– Abordagem Pikler na metodologia e no mobiliário: Criado pela pediatra austríaca Emmi Pikler, a abordagem reúne práticas e metodologias que favorecem o desenvolvimento integral da criança por meio da autonomia e do brincar livre, tendo o mediador e o cuidador como parceiros nesta jornada. Os mobiliários e brinquedos pikler são desenhados para que a criança explore o mundo ao seu redor com segurança e independência, proporcionando equilíbrio, escaladas, oportunidades para ficar de pé e manusear objetos.

Para o cuidador, é preciso oferecer espaços de fruição, com almofadas, tapetes e pisos macios, com ampla oportunidade de observação da criança, como detalha Ana: “É importante ter a presença e o olhar deste adulto. Imagine que a criança se afasta do cuidador para brincar de empilhar. Ao conseguir fazer o empilhamento, ela procura o olhar deste adulto. É uma troca que acontece sem palavras, que faz com que a criança se sinta confiante, cheia de afeto, com possibilidade e poder de explorar o mundo”

– Livros: Livros de diferentes formatos e gêneros precisam estar em mobiliários acessíveis para serem manuseados pelas crianças. Os adultos devem  acessá-los com facilidade, seja para ler com as crianças ou sozinhos e mediar as atividades.

“O bebê pequeno manuseia e explora o livro, o maior entrega o livro para o cuidador fazer uma leitura. O mediador, figura essencial na bebeteca, oferece uma roda de leitura e apresenta um repertório diverso para os presentes. Assim, o livro começa a fazer parte da rotina da família”, relata Ana.

Uma roda de mulheres está sentada num piso de madeira dentro de uma bebeteca. Alguns bebês estão sentados no chão brincando com objetos. Atrás, mobiliários pikler.

Bebetecas precisam dispor de mobiliários apropriados tanto para crianças como para cuidadores. Na foto, bebeteca em Recife / Crédito: Agência Recife para Inovação e Estratégia (Aries)

– Mediadores capacitados: A bebeteca é um espaço de mediação de afetos e aprendizados. Portanto, é necessário um corpo de profissionais formados na mediação de encontros por meio do objeto livro, e que também possa facilitar atividades que enriqueçam o vínculo entre cuidadores e bebês.

“O mediador garante combinados, números de pessoas que estarão ali e o que pode e não pode não ser feito no espaço. Munido de um olhar generoso e que acredita no potencial da criança, o mediador muitas vezes ajuda o cuidador a enxergar o que bebê já aprendeu e ainda pode aprender”, conclui Ana.

Confira como Cascavel e Recife, duas cidades Urban95, têm construído suas bebetecas em diálogo com os diferentes espaços que ocupam.

Cascavel – PR: Nos últimos meses, com o apoio da Rede Urban95, a cidade tem investido na requalificação dos equipamentos da Assistência Social a partir do olhar da primeira infância. A recém inaugurada bebeteca no Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) Morumbi faz parte dessa iniciativa, e seus servidores passaram por formações junto à equipe da Descobrir Brincando e do CECIP para proporcionar atividades lúdicas e de brincar livre para famílias em situação de alta vulnerabilidade.

A bebeteca tem um espaço de leitura para bebês e cuidadores. Para formar um acervo diverso conectado com o território e com o equipamento, os mediadores do CRAS receberam formação do Balaio de Livros, projeto do CECIP que forma mediadores de leitura em equipamentos públicos, qualificando e fortalecendo práticas desenvolvidas nos espaços com literatura.

“Costuma-se pensar que os bebês devem ter à sua disposição somente livros de pano ou de plástico. Mas para desenvolver um comportamento leitor, eles têm que aprender a manusear todo tipo de livro. Isso faz parte da formação leitora e motora”, revela Rafaela Pacola, integrante do projeto Balaio de Livros . “Estes livros têm que trazer diversidade, com histórias de famílias negras, indígenas, imigrantes, configurações não tradicionais. Também diversidade de projeto gráfico: livros maiores, menores, quadrados, retangulares, diferentes tipos de ilustração. E, por fim, gêneros literários diversos: poesia, mitos, folclore, fábulas”.

Em Cascavel (PR), mediadoras formadas ajudam a fortalecer o vínculo entre bebês e cuidadores / Crédito: Paulo Edison

Recife – PE: Os Centros Comunitários da Paz (COMPAZ) são equipamentos localizados em territórios vulneráveis e que têm a cultura e a literatura como aliadas na diminuição de índices de violência. Desde março de 2022, bebetecas foram instaladas dentro de três COMPAZ, e seus arte-educadores passaram por uma formação de seis meses com a Descobrir Brincando.

“O mediador disponibiliza brinquedos e oferece atividades para cada faixa etária, desenvolvidas a partir do acompanhamento destes encontros com as famílias”, explica Deborah Echeverria, gerente de planejamento e articulação da Rede de Bibliotecas pela Paz da Prefeitura do Recife. “Este arte-educador não interfere muito: deixa a criança no espaço, exposta aos mobiliários, livros e brinquedos, incentivando a participação e a observação do cuidador.”

O espaço de cuidado e acolhimento integrado ao território favoreceu a criação de redes de apoio entre cuidadores. As bebetecas agora contam com encontros semanais de grupos de mães, que trocam experiências e recebem apoio dos profissionais do equipamento.

Livros e mobiliário pikler fazem parte das bebetecas de Recife, que são integradas aos Compaz da cidade / Crédito: Agência Recife para Inovação e Estratégia: Aries