O impacto da gestão pública no fortalecimento de vínculos e o papel das famílias acolhedoras

As cidades da Rede Urban95 participaram de webinar com exemplos de iniciativas de cuidado

No Brasil, temos exemplos de protagonismo do Estado no cuidado com a primeira infância, de políticas públicas que buscam olhar de forma integral para o desenvolvimento das crianças pequenas. Participaram do encontro online das cidades da Rede Urban95, realizado na quinta-feira (15/03), Teresa Surita, ex-prefeita de Boa Vista (RR), e Jane Valente, assistente social, mestre e doutora em serviço social pela PUC/SP, coordenadora do Plano Municipal pela Primeira Infância Campineira – PIC.

As convidadas apresentaram exemplos de “Programas e projetos acolhedores” de famílias e crianças, que visam a garantia ao acesso a serviços, o acompanhamento do desenvolvimento, a oportunidade de acesso ao conhecimento; na garantia para as crianças de uma convivência familiar e comunitária em situações de alta complexidade.

Teresa apresentou resultados do Programa Família que Acolhe, desenvolvido em Boa Vista. “Se não houver envolvimento do gestor com a primeira infância, não há como avançar”, afirmou ao iniciar sua fala. A criação de um projeto de intersetorialidade apresenta desafios de integração de equipe interna para rediscutir a cidade. Para tornar a decisão de transformar a cidade na melhor capital do Brasil em qualidade de vida para a primeira infância, foi necessário buscar conhecimento, planejar ações a médio e longo prazo e construir parcerias com organizações que tinham o mesmo objetivo.

Teresa Surita, ex-prefeita de Boa Vista, capital da 1ª infância no Brasil

“Você não pode tratar a pobreza pobremente”, acredita Teresa. Por isso, o plano estratégico também era de universalizar a atenção à primeira infância com equidade e qualidade nos serviços prestados. Assim, criou-se um Comitê na prefeitura, com participação das secretarias de Obras, Saúde, Comunicação e Tecnologia, Educação e Social, com a presidência do secretário de Finanças, para garantir a aplicação de recursos nos projetos.

Uma vantagem para o desenvolvimento do Programa Famílias que Acolhe, foi o fato do município também ser responsável pelo Ensino Fundamental, que possibilita a continuidade do acompanhamento das crianças, que começa na gestão até os 6 anos de idade. “Naturalmente, a gente continua com acompanhamento porque elas continuam na mesma rede”, explica.

Ainda durante a gestação da criança, a Universidade do Bebê é uma escola para os pais com foco no bebê, do pré-natal aos dois anos de idade, desde a assistência no parto até a vaga na creche. “Essa é uma forma de acompanhar a criança a partir do momento que ela é gerada até entrar na nossa rede”, conta.

A partir de então, o programa conta com o “Leitura desde o Berço”, em que pais leem livros para seus filhos, o que contribui para o maior desenvolvimento das crianças, que aprendem mais palavras, e com a diminuição da violência doméstica. E também há as visitas domiciliares, o atendimento médico e as as intervenções urbanas, que foram incentivadas também pela parceria com a Urban95, entre outras iniciativas que visam o fortalecimento dos vínculos familiares, como a Oficina de Brincar.

São atendidas pelo “Família que Acolhe”, crianças com idade entre 0 e 6 anos, gestantes cadastradas no Bolsa Família, participantes das creches municipais com atendimento e apoio integral à mães de famílias de baixa renda com filhos entre 2 e 4 anos de idade,  adolescentes gestantes e suas famílias, e educandas dos sistemas penitenciários.

Jane Valente apresentou o histórico do Serviço de acolhimento em Família Acolhedora. Para ela, os avanços da primeira infância têm o desafio de olhar para as crianças em medidas protetivas e o acolhimento familiar.

Jane Valente, Coordenadora do Plano Municipal pela Primeira Infância

Jane Valente, Coordenadora do Plano Municipal pela Primeira Infância Campineira – PIC

Ela lembrou sobre a cultura de institucionalização do Brasil, em que uma criança em situação familiar vulnerável entrava em um orfanato. “O senso comum era de que as famílias empobrecidas não tinham como cuidar de seus filhos. Então, o Estado tomava para si. Bastava ser pobre que já era motivo de retirar criança”.

Com o marco da Constituição Federal, que desencadeou a criação de outros instrumentos como o Artigo 226 e o ECA, a Caravana dos Deputados e a pesquisa do IPEA, criou-se o Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária e o Marco Legal da Primeira Infância.

“A vivência da situação de risco pode proporcionar novas vulnerabilidades”, afirma Jane, que explica o caráter dirigente da Constituição Federal como instrumento de redução de riscos, que contribui para a formação de sujeitos coletivos e políticos. Assim, as famílias acolhedoras se enxergam cidadãos fazendo parte do Estado e cuidando dessas crianças.

As Famílias Acolhedoras têm o papel de abrigar uma criança que está em situação de vulnerabilidade, por um período que pode durar até 18 meses (a média hoje é de 8 meses). É importante distinguir a adoção, neste caso. Uma família cadastrada na fila de adoção, por exemplo, não pode ser uma Família Acolhedora.

Jane também destaca que, para além da pobreza, a assistência social hoje trabalha para a redução e para o enfrentamento de situações de vulnerabilidade e de risco que independem de classe social, seguindo diretrizes do ECA.

“Todo e qualquer trabalho ligado ao acolhimento familiar e a medida protetiva deve trabalhar de forma transversal”, conta Jane. “É isso que supõe a proteção integral de crianças e adolescentes”. Sendo assim, diversas políticas públicas, mas principalmente Assistência Social, Saúde e Educação, olham de forma coletiva para essas crianças.

Jane concorda com Teresa sobre fazer políticas mais ricas para as pessoas empobrecidas e afirma que “a família acolhedora ainda merece um olhar com destaque porque há crianças que podem ter a prevenção mesmo em sua alta complexidade”.

Veja como foi o webinar completo e tenha acesso a resultados dos programas no nosso canal do YouTube.